A Receita Federal lidera o combate automatizado à sonegação com plataforma de IA e redes de relacionamento que já detectam esquemas de bilhões em fraudes tributárias
Vitória – ES, outubro de 2025. Com o avanço do Projeto Analytics, a Receita Federal brasileira consolida-se como referência internacional no uso de inteligência artificial para rastrear e coibir irregularidades fiscais e aduaneiras. A iniciativa combina cruzamentos massivos de dados, análise de perfis de risco e grafos de relacionamento para identificar operações suspeitas antes mesmo de chegarem às auditorias presenciais.
A instituição tem ampliado de forma incisiva o uso de IA e análise de redes complexas para elevar sua capacidade de fiscalização e detecção de fraudes. Sob o guarda-chuva do Projeto Analytics, a plataforma já identificou esquemas que somam R$ 11 bilhões em sonegação.
A seguir, um panorama atualizado dos avanços confirmados, das aplicações atuais, dos riscos jurídicos emergentes e dos próximos passos esperados.
Panorama Atual & Avanços Confirmados
A consolidação do Analytics e casos públicos
Em setembro de 2025, a auditora Sônia Accioli confirmou que a Receita já identificou esquemas de sonegação que somam R$ 11 bilhões, graças à aplicação de IA em cruzamentos de dados fiscais e análise de perfis de risco.
Já em 2024, um dos casos tornados públicos envolveu um esquema de R$ 350 milhões utilizando criptoativos, identificado por meio de módulos do Projeto Analytics voltados para o rastreamento de criptomoedas.
Outro caso amplamente citado foi o de movimentação suspeita de R$ 700 milhões por empresas de fachada operando com importações e remessas internacionais, também detectado pela plataforma.
Esses exemplos demonstram que o sistema já atua como filtro de risco, priorizando contribuintes para auditoria aprofundada e poupando recursos humanos nos estágios iniciais de análise.
Novos módulos e técnicas em consolidação
- Um avanço recente é o uso de inteligência artificial para análise de CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas). O auditor Pedro Frantz confirmou que o Projeto Analytics está aplicando técnicas de clusterização e perfis comparativos setoriais para identificar inconsistências entre a atividade declarada e o comportamento real da empresa. Isso permitiu reduzir uma análise financeira que levava 2 horas para apenas 15 minutos.
- O uso de painéis visuais interativos com gráficos e alertas em tempo real vem sendo intensificado para auxiliar os auditores nos cruzamentos de dados e na triagem de casos com indícios de fraude.
- Para os módulos de criptoativos, a plataforma já consegue representar redes que mostram a relação entre empresas “noteiras” e beneficiárias operacionais, especialmente com o uso de stablecoins como USDT e USDC, além de remessas internacionais e criptomoedas menos voláteis.
Resultados operacionais e ganhos de eficiência
- A plataforma permite atribuição de nota de risco a declarações, de modo que autuações só sejam iniciadas quando o risco for elevado.
- Há reconhecimento de que a IA não substitui auditores humanos — ela auxilia no escalonamento e priorização dos casos mais relevantes para investigação técnica.
- Em debates públicos, a Receita já sinaliza que pretende incorporar IA generativa, bem como grafos de conhecimento (“knowledge graphs”), para tornar as relações entre entidades cada vez mais explícitas e dinâmicas.
Desafios, limitações e controvérsias
Transparência algorítmica e direito à defesa
A adoção de algoritmos complexos e “caixas pretas” levanta preocupações sobre a explicabilidade das decisões fiscais. Contribuintes e seus advogados podem alegar falta de motivação suficiente ou ausência de critério claro nos casos de autuação. Juristas têm destacado que o uso de sistemas algorítmicos no Fisco precisa observar os princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa.
Vieses, erros e riscos de autuações indevidas
Dependência excessiva de padrões estatísticos e históricos pode gerar vieses: negócios inovadores, empresas que mudaram modelo ou empreendimentos em nichos emergentes podem ser interpretados como “atípicos” e injustamente alvo do sistema de risco alto.
Qualidade de dados e integração entre bases
O sucesso da plataforma depende da qualidade, atualização e integração de múltiplas bases de dados (SPED, e-Financeira, registros cambiais, bancos de dados de exchanges, cartórios, órgãos de fronteira etc.). Qualquer ruído, atraso ou falha pode degradar a eficácia dos cruzamentos.
Limites legais e proteção de dados
Embora o Fisco alegue que suas operações de análise se valem de dados que já lhe pertencem e que essas ações não estariam sujeitas à LGPD (por estarem no âmbito funcional do Estado), o tema suscita controvérsia. Advogados apontam que eventuais usos indevidos poderiam ser questionados constitucionalmente se a intimidade financeira for exposta sem controle ou justificativa clara.
O que esperar a seguir
- Expansão planejada dos módulos para transferência de lucros para paraísos fiscais, operações complexas internacionais e mercados interpostos.
- A incorporação de IA generativa e conhecimento simbólico (graph databases) para permitir raciocínios mais sofisticados entre entidades ocultas.
- Adoção, ou exigência regulatória, de frameworks de governança de IA, com auditoria externa, logs de decisão e “caixa preta explicável”.
- Cooperação internacional mais intensa: a plataforma já foi exposta em fóruns da OCDE e há possibilidade de parcerias para cruzamento de dados com outras jurisdições.
- Pressão por regulação legal específica: projetos de lei em tramitação no Congresso visam regular o uso da IA no setor público, definindo limites de transparência e responsabilidade.
O uso de inteligência artificial pela Receita Federal marca uma virada na forma como o Estado combate a sonegação e fiscaliza grandes volumes de dados econômicos. O Projeto Analytics mostra que a tecnologia, quando aplicada com propósito público e rigor técnico, pode transformar a fiscalização em uma atividade mais precisa, preventiva e estratégica.
O desafio agora é consolidar essa inovação sem comprometer direitos fundamentais. Transparência, auditoria dos algoritmos e controle social serão essenciais para garantir que a automação fiscal sirva à justiça tributária — e não apenas à eficiência arrecadatória.
Reportagem: Curadoria jornalística de Waldeck José
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